A Emoção descansava na rede esperando o pôr do sol, olhando as ondas batendo na areia da praia, cantarolando "O que Será" versão "à flor da pele".
A Razão chegou silenciosa, com seus passos calculados, cronometrados e precisos. Sentou-se ao lado da Emoção. Ao invés da espreguiçadeira, preferiu uma cadeira. Estava ereta e olhava na mesma direção da Emoção, procurando o que ela via que tanto a sensibilizava.
Quem iniciou o diálogo foi a Emoção:
- Como tens passado, Sra. Razão?
- A refletir...
- Sobre?
Silêncio. A Razão fazia um esforço enorme naquele momento. A Emoção falava solta. Pensou dez vezes antes de responder e falou com certa dificuldade:
- Penso sobre a prisão que se encontra minhas palavras sentidas... elas vivem só no pensamento... - falou pausadamente.
- Sei como se sente. Sou pelo oposto... Elas não cabem em meu pensamento. Escorrem, se esparramam. Elas transparecem em meu rosto. Todos notam.
Outro longo silêncio... rompido novamente pela Emoção:
- Nunca sei o que estás a pensar. Algumas poucas vezes percebo respostas pelo seu corpo. Como agora, que sentas um pouco mais relaxada...
- Desculpe, é esse meu ser racional. Você já deve ter percebido as dificuldades que isso gera...
- Sim. Isso a mantém travada, sem gracejos ou rebolado.
- E você a dançar. Tão leve e contente. Sempre a sorrir. Vive numa dança sem passos marcados. Você me deixa a pensar...
-Que bom! De alguma forma, tanta lógica também me encanta. Vivo a tentar me controlar, organizar pensamentos e ações. Tenho muito a aprender contigo.
Outro longo silêncio e experimentando uma nova estratégia, quem falou primeiro foi a Razão:
- Mas a verdade é que quero sentir um pouco do que você tem... - outro silêncio - E você, Senhorita Emoção? O que procuras?
- Aquilo que ainda não conheço. Gosto de novidades. Talvez um pouco da paz que sua organização lhe proporciona. Sentir muito, às vezes, me cansa.
- Não ter liberta as palavras também me cansa. O refletir e refletir me esgota...
- Já pensastes em outra solução? Transforme pensamentos em gestos. Algumas coisas podem ser ditas sem palavras. Não todas... mas algumas podem.
Então a Razão olhou firme para a Emoção e num gesto delicado segurou-lhe a mão. Experimentou um sorriso tímido. Respondeu a Emoção com lágrimas nos olhos. Durou o tempo do sol se despedir e a noite encobrir seus rostos.
Levantaram-se e ainda de mãos dadas caminharam em direção ao mar. Mergulharam aguardando a lua cheia refletir seu brilho sobre elas.