- Mamãe, você é feliz?
Ela tinha só sete anos mas perguntava com a profundidade de uma adulto com anos de análise. Amanda parou o que estava fazendo e ficou em silêncio. Silêncio cego, surdo e mudo. Sua cabeça, que estava organizando o dia, ficou vazia. Era nesses momentos que Manu despertava uma raiva que Amanda não sabia existir dentro dela. Odiava a capacidade que sua filha tinha de ferir com sentenças tão simples. Por que eram tão diferentes?
- Você é, mamãe? É? - Manu não desistia.
A resposta que Amanda deu foi totalmente evasiva. Algo do tipo"deixe de bobagens e vá colocar seu uniforme".
Nunca conseguira responder a pergunta da filha. Não sabia o que era felicidade. Se ser uma boa profissional, boa mãe, esposa e cumprir todos os deveres era ser feliz, então ela era. Apesar do esforço para dizer que a equação estava correta, sabia que, no fundo, a resposta estava simplificada. Era apenas o prazer de preencher um espaço, como quem picha um muro branco.
Sua vida era regida pelo certo ou errado. Gostava do que era lógico, perfeito, limpo e coerente. Buscava alcançar seus objetivos.
A única equação sem solução era Manuela. Ela derrubava os cenários, contava o segredo das mágicas e colocava em xeque cada argumento da sua mãe com seus: "mas por quê?". Manu era sempre uma ameaça ao mundo perfeito que Amanda criara.
Amanda tinha grande habilidade para fugir das perguntas da sua filha. E quanto mais insatisfatórias eram as respostas, maior a distância entre elas.
Manu cresceu sem saber exatamente o que a mãe pensava e sentia. Amanda acreditava que dava o melhor de si para a filha, escondendo dela as imperfeições.
Elas não brigavam, nem se quer discutiam. Manu sofria com o distanciamento afetivo da mãe. Para Amanda tudo estava bem, ou melhoraria quando Manu se tornasse adulta. E quando isso aconteceu, Manu comunicou aos pais que iria morar sozinha.
Ao abrir a porta para o mundo, depois de esvaziar seu quarto, Manu respirou aliviada. Exatamente no mesmo momento, Amanda fechava a porta de seu quarto, chorando e ouvindo, num eco, a pergunta da menina Manu: "mamãe, você é feliz?".
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